RP BOO, UM ARQUITETO DE ESTRUTURAS SONORAS COMPLEXAS
Explorando os Labirintos Sonoros do Footwork: A Maestria de RP Boo desembarcou no Brasil para um fim de semana inesquecível.
Presenciar a performance de um artista renomado ao vivo é sempre uma experiência singular, especialmente quando se é um grande fã de seu trabalho. Nesse momento, você deixa de lado qualquer senso crítico e isso não importa, pois a grandiosidade e a complexidade da apresentação são inevitáveis. Tive o privilégio de assistir ao DJ set do DJ e Produtor RP Boo duas vezes em um único dia, em São Paulo, e posso afirmar que a experiência foi absolutamente avassaladora. É amplamente conhecida a importância de Kavain Space, também conhecido como RP Boo, na cena musical, mas é verdadeiramente impressionante como ele continua relevante no nicho underground da música eletrônica, mantendo seu status de lenda do Footwork há mais de 20 anos.
Durante a Invasão Function que ocorreu na última semana de Maio em São Paulo, conheci inúmeros artistas que trazem novamente os holofotes para gêneros um tanto nichados, como o Footwork e o Juke, ampliando a produção e pesquisa dos mesmos em solo Brasileiro. Artistas como ERAM, Akin, Tabu, Pianki, Fornazier e tantos outros, retomam essa especificidade sonora que é caracterizada pelo 160 BPM, e transformam as possibilidades acerca da Música Eletrônica Popular dentro da cena.
O gênero que reflete a energia das comunidades mais marginalizadas de Chicago, exalta uma cultura que veio da dança, e se modificou em um modus operandi da manipulação de samples. Construída em torno de uma estrutura rítmica diversa, com tambores intensos, sons percussivos complexos, amostras vocais cortadas e repetições um tanto quanto hipnóticas, os produtores de footwork constroem camadas de sons carregados de intensidade, contando uma história labiríntica e frenética.
Figura mística dentro do cenário da música eletrônica, RP Boo voltou ao Brasil após uma última visita em 2018 no festival Novas Frequências, para se apresentar na Wobble no Rio de Janeiro, e na Mamba Negra em São Paulo. Tomei a liberdade que eu não tinha para mandar uma mensagem para o artista o convidando para gravar um set na Function, algumas semanas antes dele chegar ao Brasil, e de prontidão ele me respondeu, “That Will be Cool”, e assim no dia 27 às 18Hrs ele chegou na sede improvisada na Vila Mariana, e nos emocionou durante 45 minutos.
A presença de RP Boo é inegável. Assim que ele chega, somos impactados por seu carisma e gentileza. Ao ficar em frente às CDJs, ele assume uma postura de maestro, comandando uma sinfonia a 160 BPM. Todos os presentes só conseguem sorrir enquanto ele domina o espaço com sua mistura única de elementos sonoros. Aos 24 minutos de seu set, um remix footwork da música de abertura do seriado Arquivo X invade as caixas de som, trazendo um elemento imprevisível que somente um DJ set do artista é capaz de proporcionar. Foi exatamente esse elemento que chamou minha atenção, especialmente durante seu long set na comemoração dos 10 anos da festa “Mamba Negra”. Um momento que com certeza ficará marcado para sempre na memória de todos que estavam presentes naquele ginásio.
Marcado para começar às 03hrs da manhã, sua abertura simplesmente convidava quem estivesse passando por ali para ficar e assistir uma experiência verdadeiramente única e envolvente. Desde o momento em que ele entra no palco, sua presença magnética e carisma contagiante capturam a atenção do público, criando um clima de empolgação e energia vibrante. Com uma habilidade em criar uma atmosfera imersiva incomparável, sua postura de regente é assumida assim que ele dá play na primeira faixa, levando o público em uma jornada sonora repleta de surpresas e reviravoltas. Mostrando-se como um verdadeiro mestre na arte da mixagem e manipulação de sons, seus sets são uma fusão de gêneros musicais que a cada transição, vai tecendo uma teia sonora que cativa os ouvidos e faz com que você se entregue totalmente à música.
Enquanto dançava freneticamente sem parar, havia momentos pontuais marcantes que despertavam minha consciência, como se RP estivesse me sacudindo e dizendo: “Hahaha, te peguei”. A cada mixagem, você era transportado para um local nostálgico e ao mesmo tempo refrescante, evidenciando o vasto conhecimento e sensibilidade musical de RP na pista de dança. Soul, Funk, Jazz e Footwork combinados com o Techno de Detroit, criavam uma sonoridade peculiar e convidativa, que mergulhava você profundamente e simultaneamente o trazia de volta à superfície. Era algo inacreditável, como uma montanha-russa sonora que mantém você constantemente envolvido e surpreso.
A interação entre RP Boo e o público é outro ponto incrível de se observar. Ele está constantemente conectado com a plateia, sentindo sua energia e respondendo a ela de forma instantânea. Como quando o mesmo apita, no sentido mais literal da palavra enquanto toca a faixa “SpottieOttieVIP” de Taso, DJ Rashad e DJ Spinn, ele apita e olha para o público o chamando, despertando a euforia geral. Além disso, seu set conteve uma performance hipnotizante da artista visual Bruxa Cósmica, que complementou de forma magnífica o espetáculo como um todo. Em um determinado momento ele sai de trás da CDJ e começa a interagir e dançar com a performer, fazendo a dança característica do Footwork com os pés se remexendo de forma eletrizante.
Vivenciar um show de RP Boo é embarcar em uma jornada musical emocionante, onde você se entrega à batida acelerada, perde-se na dança, e é transportado para um estado de euforia sonora. Depois de duas horas de set, você se sente extasiado, incrédulo e eufórico, com um mix de sensações capazes de mudar a perspectiva enquanto ouvinte e artista, como se você não fosse mais o mesmo de antes, uma vivência definitivamente transformadora.
Gostaria de agradecer ao artista pela aula e pelo carinho com toda a Function.fm, seremos eternamente gratos por esse momento.