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FESTIVAL NOVAS FREQUÊNCIAS COMEMORA 15 ANOS DE CURADORIA DE GUERRILHA E EXPANSÃO FORA DA LÓGICA MERCADOLÓGICA

Written by on novembro 21, 2025

Conversamos com o artista e curador Chico Dub, que trouxe dimensões sobre erguer o festival em 2025, sem nenhum patrocinador.

Existem festivais que seguem tendências, e existe o Novas Frequências, que há 15 anos, com foco, teimosia e precisão, insiste em criar suas próprias regras. Em 2025, o evento segue idealizado e comandado pelo curador, produtor e articulador cultural Chico Dub, e chega à sua edição mais simbólica num período em que o próprio Chico vive um raro ápice profissional. Entre uma residência da Recording Academy (Grammy), em Los Angeles, e outra da Tokyo Arts and Space (TOKAS), no Japão, o curador vê sua atuação ganhar dimensão global sem nunca abandonar a recusa ao óbvio, recusa essa que define há mais de uma década o DNA do festival.

Assim, para um projeto como o Novas, a gente precisa ousar, arriscar, tentar, acertar, errar, senão fica tudo na mesmice. Então por isso que o Novas abraça o risco, e a gente não é unanimidade e tá tudo bem, a gente não quer agradar todo mundo, a gente quer criar uma programação que vai te impactar. Você pode sair dali dizendo: “Não gostei”. Mas você vai falar, “me pegou, achei interessante, (ou) não é a minha, não vou ouvir em casa, não iria de novo, mas não vou sair daqui igual eu entrei.” É isso que a gente tá buscando. – Chico Dub

A edição deste ano marca também um ponto de inflexão, pela primeira vez, o Novas Frequências expande sua operação para além do Rio de Janeiro e passa a ocupar simultaneamente São Paulo, (de 3 a 7 de dezembro na capital fluminense e de 8 a 13 na capital paulista). Longe de ser uma busca por mercado, essa expansão é, nas palavras de Chico, “a reafirmação de que é possível operar em duas cidades mantendo relevância, essência e conceito”. Ele complementa, “Eu fico super orgulhoso, mas preocupado, até onde essa resiliência vai?

Essa preocupação atravessa toda a edição. Pela segunda vez em quatro anos, o festival é realizado sem patrocínio, num formato que Chico define como “de guerrilha”. As limitações materiais, porém, não freiam os objetivos de Chico para o Novas Frequências. “É um milagre conseguir fazer uma edição tão legal, com artistas massa, e com nada. É triste ter que fazer assim depois de 15 anos, mas ao mesmo tempo é um grito de guerra. Olha como dá pra fazer um festival foda sem concessões, mesmo sem dinheiro.” Ele insiste que o NF nunca quis se colocar no underground nem virar mainstream, “Sinto falta de propostas que ocupem esse lugar do meio. Por que não existe esse meio? A gente (Novas Frequências) tenta existir nele.

Operar nessa lógica “ao contrário” segue sendo a força do Novas Frequências. “A gente tem uma política de não fazer concessão ao que as pessoas querem ouvir, ao que o patrocinador quer. A gente espalha o festival pela cidade, a cidade é o palco do Novas Frequências”, explica Chico. Isso significa evitar galpões artificiais e estruturas infladas que deixam zero de legado urbano, priorizando espaços vivos, que dialogam com o ecossistema cultural real. É também por isso que, por mais potente que seja o line-up de 2025, com nomes como: Kara-Lis Coverdale, Sarah Davachi, Concepción Huerta, Wolf Eyes, Praed, Birushanah, Papangu, Faizal Mostrixxx, Cashu, ALGOL, Marina Mello, Anti Ribeiro, Marina Cyrino, Edgar & Os Fita, Luciana Rizzo, Test & Deafkids, Birushanah, Papangu, Metá Metá, Escola de Mistérios e tantos outros, esta edição opera majoritariamente em formatos já existentes, devido à ausência de recursos, mas sem abrir mão dos valores fundamentais que construíram o festival. “O modelo festival como a gente conhece hoje em dia, ele banalizou. Ele virou arroz com feijão, toda hora tem.. e acho que está na hora de repensar esse modelo, será que dá pra repensar ele dentro do chamado festival? Um encontro que acontece uma vez por ano, em tais tais dias… Outra forma de atuação em que de repente a gente consiga estar mais presente, não só uma vez por ano, mas 365 dias por ano, isso é o que está deixando meu cérebro frito, é isso que eu estou querendo pensar, atuar.

Ao longo dos anos, a curadoria do NF amadureceu. Chico reconhece que antes havia um olhar excessivamente voltado ao radicalismo como sinônimo de experimental. “Achávamos que experimental precisava ser 100% extremo. Hoje entendemos onde está o experimental dentro de cada gênero.” Isso abre espaço para artistas que tensionam fronteiras por outras vias, do pop inventivo às tradições desconstruídas, sem jamais escorregar para o óbvio. “É mais provocativo trazer alguém que opera no limite do pop do que repetir fórmulas radicais. O experimental hoje é ampliar horizontes.

Esse entendimento aparece também nas ações extra festival, que em 2025 adensam a dimensão estética do NF. Em outubro, a instalação “Zona de Escuta” transformou o Sesc 24 de Maio em uma estação hi-fi onde discos dos anos 70 eram ouvidos como rituais coletivos. Pouco depois, a instalação inédita de Craca, na conferência Futuros Possíveis (Casa Firjan), colocou o som como motor de imaginação política. Para Chico, é fundamental deslocar o espectador.  

O barato da instalação sonora é que ela não é mediada pelo início, meio e fim, você pode ficar ali quanto tempo você quiser e ouvir, re-ouvir aquilo tudo ali rolando. Você não tem um ponto focal, você não tem uma determinação, uma delimitação de onde estar, então acho que isso quebra um pouco das regras de como você deve se comportar em torno de uma experiência, claro que no caso uma instalação, mas uma experiência sonora mesmo né, é muito importante também.. E o Novas tem essa pegada, beleza é música, mas também é som e é claro que a gente pode entender que tudo é a mesma coisa, que todo som é música, e eu sou um adepto dessa filosofia, mas às vezes é importante também criar essa delimitação, criar essa separação pra fazer as pessoas entenderem que a gente também se relaciona com frases e depoimentos de pessoas como, Ailton Krenak, Pierre Levy, Milton Santos.. a gente tem Eugenio Lima.. vários pensadores da contemporaneidade falando ali, e isso é som, isso é música. ” explica Chico.

A abertura para novos territórios sensoriais se amplia com a exposição “No Raiar da Noite”, que mapeia dez anos das festas independentes de música eletrônica no Rio e em São Paulo, e com apresentações que acontecem em espaços cuidadosamente escolhidos, não apenas por adequação técnica, mas pelo que significam enquanto experiência. “ Tão importante quanto a programação é o diálogo com o lugar. Cada espaço dá o tom do tipo de música. É um quebra-cabeça onde nem todas as peças se encaixam, e é isso que cria a beleza do todo.

Mesmo em um ano “careta” na estrutura, o NF mantém momentos emblemáticos. No Rio, o evento no Parque Lage reúne seis artistas em três espaços diferentes, permitindo que o público circule por sonoridades em sequência, é lá que a instalação de Craca fica aberta durante toda a semana do festival, convidando o público a escutar o futuro de forma coletiva e não-linear; já em São Paulo, a experiência se espelha na Central Técnica do Theatro Municipal, um acervo vivo raramente aberto ao público.

Para Chico, a equação da curadoria continua sendo “a pergunta de um milhão de dólares”, como ser fiel ao conceito e ainda assim encontrar público? Ele compara fazer essa curadoria como fazer uma discotecagem: “Eu comecei como DJ, e no fundo é a mesma coisa, criar uma narrativa. É montar um quebra-cabeça com peças que às vezes se encaixam, às vezes não. E é aí que nasce o festival.

No fim das contas, o que faz do Novas Frequências um festival singular não é apenas sua programação sempre arriscada, e radical, é sua insistência ética em lembrar que criatividade é um território vivo, que demanda coragem, que não precisa ser dobrar por métricas de mercado.  

Eu fico meio pasmo porque por um lado, se a gente não fomenta a experimentação, a gente não tem renovação da arte. É na experimentação que se cria coisa nova, e quem pode pagar por isso tipo Beyoncé e etc vai estar sempre pegando e contratando a galerinha beatmaker, num quartinho escuro e fazendo os beats e as sonoridades mais extremas e interessantes do mundo. Se a gente não fomenta isso, não apoia isso, e de novo… não estamos falando de milhões, a gente tá falando de investimento sim, patrocínio sim, fomento sim, mas a gente não tá falando da casa de milhões. O que você gasta pra fazer num final de semana em São Paulo, o festival que dá pra fazer é papo de uns 50 festivais espalhados pelo Brasil. Não tem um banco que queira pulverizar sua forma de atuar. Na minha cabeça, se fizer 50 projetos espalhados pelo Brasil, vai render tão ou mais do que botar tudo num final de semana só.

Em 2025, celebrar 15 anos significa atravessar um marco e inaugurar um novo ciclo, para Chico Dub, para o festival, e para os modos possíveis de existir no meio que ninguém sabe se existe, mas que o Novas Frequências insiste há uma década e meia em manter vivo.  

Eu costumo dizer que o Novas Frequências é um festival de arte, que tem a música e o som como desdobramento, então é uma vontade de…(fazer) e eu adoro essa coisa do “meio”, porque não é uma coisa nem outra, a gente é um festival de música mas que se aproxima da arte contemporânea, a gente não tá visando like, views, palco cheio, a gente tá visando o futuro da música, a gente tá visando novos gêneros, a gente tá visitando hibridizações entre linguagens da arte, a gente tá fomentando isso, experimentando isso, promovendo isso, então a gente tá muito menos dentro de uma lógica de mercado que eu acho que aí é a coisa da música, da música como entretenimento, e muito mais próximo da arte, então é uma forma também de nos posicionar, de nos colocar, e eu acho que arte no mundo inteiro é financiada e subsidiada e patrocinada e apoiada, novas linguagens.. estamos criando novas linguagens, sem renovação de novas linguagens, a gente não renova arte. – Chico Dub

TEXT POR: ISABELA CAROLINA ROSA

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